terça-feira, 17 de novembro de 2009

Lula, O Filho do Brasil

Polêmica com Lula no cinema

Longa-metragem dirigido pelo cineasta Fábio Barreto sobre parte da trajetória de vida do presidente inaugura a 42ª edição do festival de brasília. Mesmo fora de competição, filme provoca debate

O filme Lula, O Filho do Brasil, abre o 42º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro hoje à noite no Teatro Nacional, na capital federal. A sessão de abertura, fora de competição, já é polêmica por questões óbvias. Com direção de Fábio Barreto, e com o ator Rui Ricardo Diaz, conhecido no teatro paulistano, no papel de Lula e Glória Pires como a mãe do presidente, o filme será lançado comercialmente em janeiro de 2010. Segundo Fernando Adolfo, coordenador geral do festival, o convite foi feito ao diretor do longa em agosto, pois já era certo que o filme estaria finalizado em novembro, em tempo hábil para participar do festival, o mais antigo e um dos mais prestigiados do País. O cerimonial não prevê a presença do presidente na sessão, pois ele está viajando, mas vários políticos, ministros e funcionários do primeiro escalão confirmaram que vão assistir ao filme.

“É claro que ninguém é inocente e o Festival de Brasília sempre teve a discussão política, seja a política em geral como as políticas culturais de forma mais específica, em sua programação. Isso pode acontecer com os filmes, nos debates, na manifestação dos artistas e do público. Este filme em especial traz um personagem importantíssimo e sim, eu sabia que haveria polêmica no lançamento comercial em janeiro. Agora, obviamente, fazendo seu lançamento aqui em Brasília, o debate seria antecipado. Tanto por ser a capital do País, como pelas características do festival, de procurar abrir espaço para a discussão livre, o impacto será grande, tanto entre a platéia cativa do festival, o público em geral quanto para os políticos”, disse Fernando Adolfo ao POPULAR por telefone.

Fábio Barreto, diretor de O Quatrilho (que concorreu ao Oscar de filme estrangeiro em 1997), baseou o roteiro no livro de Denise Paraná, lançado em 2002, sobre a trajetória do presidente, nascido em Garanhuns (Pernambuco), numa família pobre, que depois se mudou para São Paulo como retirante. Em abril, durante o Cine Pernambuco, no Recife, quando estava prevista uma sessão do filme não-finalizado, o que não aconteceu, o cineasta deu entrevista ao POPULAR. “Bom, a ideia veio do meu pai, que também é nordestino, o produtor Luis Carlos Barreto. Meu pai considera, de certa forma, as trajetórias dele e do Lula um pouco parecidas, na medida em que são migrantes que foram do Nordeste para o Sul e que tiveram êxito. Meu pai me convidou para a direção e disse que eu era o cara certo para esta missão. E eu perguntei, por quê? “Você tem a capacidade de fazer bem o filme de época, o filme histórico, e encaixar bem isso poeticamente”.

Fases
Segundo o cineasta, o filme aborda desde a infância de Lula até sua chegada a líder sindical, antes da fundação do PT. Além do livro de Denise Paraná, o roteiro, que contou com Daniel Tendler e Fernando Bonassi, é dividido em fases, e foi inspirado em entrevistas com o presidente, parentes e pessoas que conviveram com ele. “Os cortes temporais se dão do nascimento à sua ida para São Paulo, num pau-de-arara, aos 7 anos. Daí eu vou para os 14 anos, depois para os 20. E aí o filme segue a trajetória dos 20 aos 35 anos de Lula”, disse o diretor, que conhecia Lula desde os anos 80, quando começou a carreira, documentando as greves no ABC paulista. “Antes de filmar estive com ele para tirar dúvidas sobre as relações dele com os irmãos, com outros líderes sindicais e li passagens do roteiro para ele. Lula me esclareceu muitas coisas, mas sem interferência. ‘Não quero nem poderia interferir em nada, que você seja completamente livre para fazer uma coisa boa’, me disse o Lula.”

O cineasta define o filme como um épico realista e o resume como a história de uma família, como milhões de famílias, que passaram e passam por coisas semelhantes: não é um documentário, mas uma ficção baseada em fatos reais. “Pessoas que saem do nada e tinham tudo para dar errado. Essa família representa o povo brasileiro, sua tenacidade, resistência ao enfrentar a vida, sem se deixar intimidar pelas adversidades. Enfrentam e vencem. O povo brasileiro é assim, de extrema qualidade, e digo isso com a experiência de quem já viajou praticamente o mundo todo. É uma homenagem ao povo brasileiro através da família Silva. É uma narrativa, também, sobre a relação entre a mãe e um filho, sobre a forma como ela incutiu nele valores morais, princípios éticos, de dignidade, que deram o que deu”, exalta o cineasta.

Dificuldades
Fábio Barreto adianta que evitou tomar partido. “O filme vai até Lula se tornar presidente do sindicato, ser preso e sair da cadeia para o enterro da mãe. Antes da fundação do PT. Claro que tem a parte política dos sindicatos do ABC paulista, um lugar que foi o coração para a precipitação do fim do regime militar. O enfrentamento da classe operária foi o que fez com que os militares fossem embora mais cedo, graças a Deus. O Figueiredo assumiu em 1979 e logo foi deflagrada uma greve gigantesca que durou 40 dias. Em 1980 a mesma coisa e foi aí que prenderam o Lula”. Fábio teve dificuldades para obter informações e achou complicado retratar no filme questões como a morte da primeira mulher dele, a depressão de Lula e em seguida sua fase de mergulho na bebida. “Mas está tudo lá”, garantiu.

As implicações políticas inevitáveis do filme, defende o cineasta, não correspondem necessariamente a um olhar partidário pessoal. “Encaro esta condição de artista com o dever de não impor meu ponto de vista próprio sobre o que eu faço. A minha ideologia é expor, relatar, informar. O julgamento fica para quem assiste ao filme. Ainda mais se tratando da vida de um homem que todo mundo conhece, baseado em fatos reais, tenho o dever de expor as coisas de forma mais fiel à realidade. É claro que inconscientemente sempre vai ter uma coisa minha, algum tipo de posicionamento meu. Não vou dizer assim: olha como o Lula é maravilhoso, porque senão viraria um filme político chapa branca, eleitoreiro. Coloquei no filme o que eu pude saber e conhecer da vida dele, sem favorecer ou atacar, como em todos os filmes que fiz.”


Nenhum comentário:

Postar um comentário